quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Minhas aulas de artes - 1: ABAPORU

Olá.
Como todo mundo que acompanha o blog já sabe, eu, além de escritor e desenhista, sou professor. É o meu legítimo ganha-pão, já que os desenhos, em poucas oportunidades reais, rendeu algum dinheiro.
Sou formado em História, mas, nos últimos tempos, estou lecionando Educação Artística.
Uma das técnicas das aulas é a sensibilização dos alunos para as grandes obras de arte produzidas ao longo do tempo, junto com a elaboração de atividades envolvendo arte.
Não tendo muito assunto a tratar aqui no blog, resolvi relatar algumas atividades envolvendo artes, desenvolvidas nas minhas aulas. Algumas dessas atividades também vão estar disponíveis no blog sobre educação onde colaboro regularmente, o Educar é Viver (http://orientarpedagogos.blogspot.com.br/).
Para começar, uma aula desenvolvida, há pouco tempo, envolvendo o Abaporu de Tarsila do Amaral.



O ABAPORU
Autora: Tarsila do Amaral
Ano: 1928
Óleo sobre tela, 85 x 72 cm
Atualmente em exposição no Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires, Argentina (MALBA)
Pertencia anteriormente ao empresário brasileiro Raul Forbes, mas foi comprada em 1995 pelo argentino Eduardo Constantini por US$ 1,5 milhão.
Tarsila do Amaral (1886 - 1973) é considerada uma das maiores expoentes da pintura modernista brasileira. O modernismo brasileiro iniciou-se nas primeiras décadas do século XX, por artistas - pintores, escultores e escritores - que, estudando na Europa, começaram a trazer para cá as estéticas em voga nesse continente na época, como o futurismo, o cubismo, o dadaísmo e o abstracionismo. E, absorvendo a influência das novas vanguardas artísticas estrangeiras, iniciaram um movimento de ruptura com as velhas regras das artes - o chamado academicismo - e a criação de uma arte totalmente nova, menos identificada com o gosto das elites e mais identificada com a arte de caráter popular e com o folclore brasileiro. Entre os artistas desse movimento, estavam os pintores Emiliano Di Cavalcanti e Anita Malfatti, o escultor Victor Brecheret, o músico Heitor Villa-Lobos e os escritores Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Manuel Bandeira.
Apesar de já terem ocorrido manifestações do modernismo brasileiro anos antes, como a exposição de quadros de Anita Malfatti em 1917, o principal evento do movimento modernista foi a Semana de Arte Moderna de 1922, ocorrida no Teatro Municipal de São Paulo, onde um grupo de artistas apresentou manifestações artísticas inspiradas nas estéticas modernas da Europa. Inicialmente, os modernistas enfrentaram duras críticas e o desprezo da sociedade, antes de conseguirem se afirmar e influenciar outros artistas em anos posteriores.
Tarsila do Amaral não participou da Semana de Arte Moderna, mas se tornou grande expoente do modernismo brasileiro, com seus quadros de cores fortes, desenhos simples, reduzidos ao essencial e cheios de formas e de tridimensionalidade, retratando aspectos do povo brasileiro, a natureza do país e inserindo elementos das culturas negra e indígena. Tudo isso está presente no seu quadro mais famoso, o Abaporu.
Em tupi, língua indígena, "abaporu" significa "homem que come gente, antropófago". A tela foi pintada como um presente de Tarsila para o então marido, Oswald de Andrade. Este, inspirado pelo quadro, criou um novo movimento modernista, o Movimento Antropofágico, em 1928. Mais radical dos movimentos de vanguarda pós-1922, o Movimento Antropofágico visava a "devoração" das estéticas artísticas estrangeiras para a criação de uma arte genuinamente brasileira. Ou seja: pegar o essencial da arte estrangeira, e, a partir desses elementos, misturados com as influências das manifestações populares do povo brasileiro, criar uma estética totalmente original.
O Abaporu retrata uma criatura de pés e mãos desproporcionais em relação à cabeça e ao restante do corpo, sentada ao lado de um cacto, com o sol em cima. A criatura seria uma criatura mitológica indígena, devoradora de homens, mas que disfarça esse aspecto com sua aparência inofensiva. O quadro, devido às transições de cor, apresenta tridimensionalidade, e as cores vivas refletem a natureza de nosso país, cheia de luz e cor.

Dentre as atividades a ser desenvolvidas a partir do Abaporu, sugerimos que os alunos elaborem uma releitura do quadro. A partir da representação da tela, os alunos devem criar sua própria reinterpretação do quadro: mudando suas cores, o cenário em volta da criatura, acrescentando elementos que não estão presentes no quadro... Mas a recomendação é que o Abaporu criado pelo aluno não se afaste demais da tela original: ela deve manter os elementos icônicos, que premitam que o quadro em que se baseia seja reconhecido pelo observador. As técnicas podem variar: pintura a lápis de cor, tintas, usando materiais como emborrachado (EVA), massa de modelar... Seja qual for a técnica escolhida, o professor deverá orientar o aluno.

Para um melhor entendimento da lição, o professor já deve, antes de iniciar a aula (e naturalmente colocando um fac-símile do Abaporu na sala), fazer sua própria releitura do Abaporu, a título de demonstração. Aqui embaixo, a minha:
O meu Abaporu foi feito em folha de ofício, tamanho A4, pintado a lápis de cor. No meu entendimento, o Abaporu teria uma mão e um pé enorme por causa da perspectiva - eles parecem maiores que a cabeça e o corpo porque estão sendo vistos de baixo. Por isso, incluí no desenho um indiozinho, que perto do Abaporu parece pequenino, e, se não fugir depressa, acabará se transformando em repasto (refeição) da criatura. Minha releitura, portanto, recebe o nome de "Diante do Abaporu".
E esta foi a nossa primeira lição de arte de hoje. Em breve, mais lições ao leitor dos blogs Estúdio Rafelipe e Educar é Viver.
Até mais!

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