quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

OS 25 MAIORES MOMENTOS DOS QUADRINHOS BRASILEIROS - Parte 1

Olá.
Hoje, enquanto escrevo, ainda é 30 de janeiro. Dia do Quadrinho Nacional.
E, nesse ínterim, para celebrar esse dia, e para esquecer um pouco a comoção gerada pela tragédia em Santa Maria, resolvi iniciar uma nova série de postagens aqui no blog. Resolvi fazer algo um pouco diferente: recontar a História das HQ no Brasil, elegendo seus 25 maiores momentos!
Sim. Como a História dos Quadrinhos no Brasil é assunto muito amplo, e tem momentos enormemente significativos, ficaria difícil escolher apernas cinco, ou dez. Resolvi eleger 25. E, a partir de hoje, cada postagem trará cinco momentos.

Os acontecimentos serão dispostos em ordem alfabética, não dando preferência a um fato específico, nem dando uma colocação para cada um. A seu modo, os 25 fatos escolhidos são muito significativos. E, advertindo os leitores, a escolha dos fatos leva em conta opiniões pessoais - alguns deles são consenso entre especialistas, mas eu sou um blogueiro e entusiasta amador, portanto, vocês não precisam concordar comigo, necessariamente. É só uma forma de levar até vocês um conhecimeto maior sobre os quadrinhos do Brasil.
Então, começando a viagem no tempo, os fatos mais óbvios, segundo os especialistas...

1 – A aparição de “As Aventuras de Nhô Quim”, de Ângelo Agostini (1869)

O desenho de humor já é tradição dentro do Brasil desde 1837, ano em que teria sido produzida a primeira charge publicada – A Campainha e o Cujo, de autoria atribuída a Manuel de Araújo Porto Alegre, publicada no Jornal do Comércio do Rio de Janeiro, em 14 de dezembro desse ano. As charges e o desenho humorístico seriam muito cultivados durante o Segundo Reinado do Império Brasileiro (1840 – 1889), e, através de revistas e jornais, nomes do cartunismo brasileiro do século XIX, como Aluísio de Azevedo e Rafael Bordalo Pinheiro, seriam consagrados. O ítalo-brasileiro Ângelo Agostini (1843 – 1910) já era um artista consagrado dentro de nosso país, e um dos maiores nomes do desenho humorístico durante o Segundo Reinado, quando resolveu lançar, no periódico Vida Fluminense, esta que é uma das primeiras aventuras seriadas do Brasil – e do mundo. Dois anos antes, ele já havia feito, para o periódico O Cabrião, a narrativa sequencial pioneira As Cobranças. As Aventuras de Nhô Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte foi iniciada em 30 de janeiro de 1869, e durou nove capítulos. Nhô Quim pode ser incluído entre as séries continuadas pioneiras do mundo, como o Monsieur Vieux-Bois, do suíço Rudolf Töpffer (iniciado em 1827), o Max und Moritz do alemão Wilhelm Busch (1865) e a Família Fenouillard, do francês Christophe (1889). O dia 30 de janeiro acabou sendo escolhido, em 1984, como o Dia do Quadrinho Nacional, com base em pesquisa de Álvarus e Ofeliano de Almeida. Na mesma ocasião, foi também instituído o Prêmio Ângelo Agostini, a segunda maior premiação dos quadrinhos brasileiros – só perde em importância para o HQ MIX, instituído em 1988. A história de Nhô Quim, tal como as narrativas seriadas do século XIX, era constituída por desenhos sucessivos e legendas, não dispondo de balões e onomatopeias (palavras que imitam sons), e seu argumento, para os padrões de hoje, é bastante vulgar, e constantemente usado em histórias humorísticas – um homem do interior que vai visitar a cidade grande. Agostini, cujo trabalho só recentemente começou a ser devidamente resgatado, lançaria outra narrativa sequencial, as Aventuras de Zé Caipora, em 1876 (curiosamente, o inverso de Nhô Quim: a história de um homem citadino que vive desventuras na área rural), dentro da Revista Ilustrada, criada pelo artista em 1876. Agostini também seria lembrado por seus desenhos humorísticos que satirizavam a política imperial e por sua apaixonada defesa da causa da abolição da escravatura, que ocorreria em 1888. Agostini, adentrando o século XX, também seria o responsável pelo primeiro logotipo da revista O Tico-Tico.

2 – A aparição da revista “O Tico-Tico” (1905)
É unânime entre os especialistas: o movimento das HQ modernas no Brasil iniciou-se com o lançamento da revista O Tico-Tico, em 11 de outubro de 1905, que, antes de tudo, era um almanaque infantil reunindo textos literários e informativos, passatempos, ilustrações e histórias em quadrinhos – mas era a primeira revista brasileira voltada ao público infantil a publicar quadrinhos. Idealizada pelo jornalista e caricaturista Renato de Castro, pelo poeta Cardoso Júnior e pelo professor e jornalista Manoel Bonfim, e encampada por Luís Bartolomeu de Souza e Silva, dono da Sociedade O Malho, O Tico-Tico nasceu inspirado na revista francesa La Semaine de Suzette, como um suplemento da revista O Malho, editada no Rio de Janeiro, Capital. Esta revista trazia como principais atrações, inicialmente, séries estrangeiras, como Buster Brown, de Richard Fenton Outcault (criador do Yellow Kid), o Mickey Mouse de Walt Disney, Popeye de Elsie Segar, Krazy Kat de George Herriman e Gato Félix de Pat Sullivan. O personagem de maior sucesso era o Buster Brown, chamado Chiquinho no Brasil – tanto que, quando o personagem parou de ser publicado nos Estados Unidos, artistas brasileiros continuaram produzindo as histórias do personagem para a revista, a saber: Luis Gomes Loureiro, Augusto Rocha, Alfredo Storni, Paulo Afonso, Oswaldo Storni e Miguel Hochmann. E contribuíram ainda para “nacionalizar” o personagem. Além dos personagens estrangeiros, houveram também histórias produzidas por artistas brasileiros, como Lamparina, do célebre caricaturista J. Carlos (José Carlos de Brito e Cunha), Kaximbown, de Max Yantok, Zé Macaco e Faustina, de Alfredo Storni, Reco-Reco, Bolão e Azeitona, de Luís Sá, Tinoco, o Caçador de Feras, de Théo (Djalma Pires Ferreira), Bolinha e Bolonha, de Nino Borges, e muitos outros. A revista, sintonizada com as preocupações pedagógicas do início do século XX, fez muito sucesso, e teve como leitores ilustres o jurista Rui Barbosa (que chegou a citar o Tico-Tico em um de seus discursos) e o poeta Carlos Drummond de Andrade, mas foi encerrada em 1962, por causa não apenas do desgaste de seu modelo, mas também pela mudança de preferência do leitor, que passou a se interessar mais pelos quadrinhos de aventura importados dos EUA – culpa do Suplemento Juvenil de Adolfo Aizen e do Globo Juvenil de Roberto Marinho. O Tico-Tico bem que tentou, tardiamente, entrar na onda de publicar quadrinhos de aventura, mas não deu muito certo.

3 – A aparição do “Suplemento Juvenil” (1934)
O baiano Adolfo Aizen (1907 – 1991), dono do Grande Consórcio Suplementos Nacionais (GCSN), foi um dos maiores magnatas da indústria brasileira dos quadrinhos. Ele começou a fazer história quando, após um contato promissor com a megacorporação King Features Syndicate, durante viagem aos EUA, ele resolve lançar, em 14 de março de 1934, dentro do jornal A Razão, do Rio de Janeiro, de propriedade do jornalista João Alberto Luis de Barros, o Suplemento Infantil (na mesma ocasião o GCSN foi criado); porém, numa aposta ousada, resolve, após quinze números, lançar esse Suplemento de quadrinhos de forma independente, dando origem ao Suplemento Juvenil, publicado às terças, quintas e sábados. É o marco da publicação de HQ como indústria cultural dentro do nosso país – a partir dele, as HQ de aventura produzidas nos EUA começam a se popularizar no Brasil, ajudando a suplantar as propostas pedagógicas pueris d’O Tico-Tico. No Suplemento, são publicadas as histórias de Flash Gordon, Jim das Selvas, Agente X-9, Tarzan, Mandrake, Dick Tracy e Príncipe Valente. Todos comics estrangeiros, distribuídos por syndicates dos EUA, mas também havia espaço para brasileiros: Monteiro Filho, com Os Exploradores de Atlântida ou As Aventuras de Roberto Sorocaba, considerado o primeiro herói brasileiro das HQ, e Carlos Arthur Thiré, com O Gavião de Riff, Três Legionários de Sorte e Raffles. O Suplemento Juvenil durou dez anos, e ganhou concorrentes à altura: o Globo Juvenil, de Roberto Marinho (também do Rio de Janeiro), e a Gazetinha, de Cásper Líbero (editada em São Paulo). O GCSN também seria responsável pela revista O Lobinho, que apareceu em 1939; concorrente direto da revista O Globo Juvenil, O Lobinho seria lembrada como a revista em que o Batman faria sua estreia no Brasil, em 1940). O golpe de misericórdia no Suplemento seria dado pelo próprio Roberto Marinho, que compra o catálogo da King Features Syndicate e ganha a exclusividade da publicação de seus principais heróis.

4 – A aparição de “A Garra Cinzenta” (1937)
O Suplemento Juvenil não demoraria a ganhar concorrência dentro do mercado editorial do início do século XX. Um dos mais famosos concorrentes do suplemento de Adolfo Aizen era a Gazeta Infantil, ou Gazetinha, que apareceu em 1929, dentro do jornal Gazeta de São Paulo, de propriedade de Casper Líbero. A Gazetinha também publicava séries estrangeiras, como Fantasma e Superman (foi ali que o chamado “Fantasma Voador” e o Homem de Aço fariam sua estreia no Brasil – curiosamente, a publicação das aventuras do Fantasma na Gazetinha era simultânea à que estava ocorrendo n’O Globo Juvenil). A Gazetinha teve três grandes fases de publicação: a primeira, de 1929 a 1930; a segunda, e considerada a melhor fase, de 1933 a 1940; e a terceira, de 1948 a 1950. Na Gazetinha, além do material estrangeiro, também apareceram séries feitas por brasileiros, como Audaz, o Demolidor, de Messias de Mello. Mas a série mais importante publicada naquela folha foi A Garra Cinzenta, considerada a nossa primeira HQ de terror, antes do terror “explodir” em nosso país – na verdade, uma história policial em capítulos, mas com níveis de violência e elementos de ocultismo e morbidez inéditos para aquela época. A história da perseguição do policial Frederic Higgins ao gênio criminoso que dá nome à história envolvia inclusive assassinatos, investigações detetivescas, inovações tecnológicas à frente de seu tempo, monstros, passeios por catacumbas cheias de passagens secretas, profanações de túmulos e até um robô, numa trama claramente influenciada pelas narrativas fantásticas dos pulps (revistas de contos policiais e de ficção científica) norte-americanos. Os realizadores desta série, que foi inclusive exportada para México, Bélgica e França, eram Francisco Armond (roteiro) e Renato Silva (arte). Em tempos recentes, chegou a se especular que Armond, cuja identidade era misteriosa, fosse o pseudônimo usado por Helena Ferraz, poetisa e mulher de Maurício Ferraz, dono da Livraria Civilização e do jornal Correio Universal, do Rio de Janeiro (esse jornal editou, em álbuns, dois importantes trabalhos do pintor e historiador Francisco Acquarone: a primeira adaptação para HQ do romance O Guarani, de José de Alencar, e João Tymbira em Redor do Brasil). Os 100 capítulos da série ficaram perdidos no tempo durante o século XX, apesar de terem sido compilados cerca de três vezes – em dois álbuns d’A Gazeta, em 1939 e 1940, em um volume do Almanaque Gibi Nostalgia, da editora RGE, em 1975 (que ficaria incompleta, sem trazer a segunda parte da série), e no fanzine Seleções da Quadrix no. 3, de 1988, editado por Worney Almeida de Souza. Somente em 2010 as gerações mais novas conseguiriam ler a obra na íntegra, quando ela foi republicada pela editora Conrad, compilada pelo mesmo Worney Almeida de Souza. A Garra Cinzenta pavimentou, de certa forma, o caminho para a explosão do gênero terror nos quadrinhos brasileiros; gênero que fez escola dentro de nosso país. Mas o primeiro gibi de terror, propriamente dito, foi o Terror Negro, da histórica editora La Selva, lançado em 1950 – embora o nome derivasse de um personagem criado nos EUA por Jerry Robinson, o conteúdo da Terror Negro era de outra revista norte-americana, Beyond. E, a partir da iniciativa da La Selva, outras editoras menores, quase todas de São Paulo, publicam suas próprias revistas de terror.

5 – A aparição do “Gibi” (1939)
Antes de 1939, gibi era uma palavra para definir os meninos negros. Roberto Marinho (1904 – 2003), herdeiro das empresas O Globo, que englobavam o jornal homônimo, (fundadas por seu pai, Irineu Marinho) havia feito uma primeira investida de sucesso no campo editorial das HQ com o suplemento O Globo Juvenil, lançado em 1937. Nessa publicação eram editadas séries humorísticas norte-americanas, como Ferdinando, Zé Mulambo e Brucutu. Porém, a revista mais popular da cadeia de Roberto Marinho seria O Gibi, lançado em 1939, para concorrer diretamente com a revista Mirim, do GCSN. A revista passa a designar qualquer publicação de quadrinhos do Brasil – quem não gostava dessa história era o concorrente, Adolfo Aizen, que se incomodava em ver as revistas que editava chamadas pelo termo que fazia referência a seu grande rival. A publicação também daria origem a uma expressão popular: quando um fato é inacreditável, parece lenda ou mentira, se diz que “não está no gibi” – prova de o quanto a revista de Roberto Marinho foi influente. Em O Gibi, também trissemanal como foi o Suplemento Juvenil, depois mensal, foram publicados os personagens Capitão Marvel, Tocha Humana, Príncipe Submarino, Charlie Chan e vários outros personagens. Mais tarde, Marinho fundava sua própria editora de quadrinhos, a RGE (Rio Gráfica Editora, atual Editora Globo), em 1952, concorrente direta da EBAL, e cujo carro-chefe era o Fantasma de Lee Falk, embora a editora fosse a que mais tinha títulos em banca em meados dos anos 60, publicando por um período até os heróis da Marvel Comics. O Gibi foi retomado pela RGE em 1974, e depois pela editora Globo, em 1993 (praticamente, a mesma editora) – mais para a manutenção dos direitos sobre o título.

Na próxima postagem, os fatos 6, 7, 8, 9 e 10.
Como ilustração minha, deixei uma imagem já publicada do Garra Cinzenta. As outras imagens foram extraídas da internet.
Fiquem ligados!
Até mais!

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